terça-feira, 25 de setembro de 2012

A verdade.



Tava eu deitado na minha cama, lendo um dos meus livros de Direito, e ouvindo uma musica enquanto eu estudo(sim, só consigo estudar assim), em um tom urgente o meu telefone começou a tocar e a vibrar sem cessar. Continuei estudando, ignorando aquela chamada, e com a esperança que a pessoa cansasse de ligar, mas não cansou.
Atendi o telefone logicamente muito “puto”:

- Alô.

- Oi, sou eu. Creio que eu tenha assassinado a verdade.

Eu sem entender direito perguntei:

- A verdade? Como assim?

- A verdade literalmente.

- Sei e ai?

- Jean, eu tava na minha quando ela entrou. Eu tava naquele barzinho perto do Recife Antigo, que a gente bebeu todas e acabou tendo que voltar pra casa de taxi porque nenhum de nós dois tinha condições de dirigir?

- Lembro...

- Pois bem, eu tava lá, ela chegou com um sorriso torto, havia algo em seus olhos, e algo na sua risada, e algo muito estranho na sua voz. Bom, eu já tava bêbado quando uma mulher sentou do meu lado, se eu não me engano devia ter os seus 27 anos por ai, vestia uma saia curta, com uma blusa decotada, lembrava um pouco uma garota de programa, mas eu não tava me importando. Eu só conseguia olhar para as pernas dela, pra aquele corpo perfeitamente delineado, e ela acabou vendo que eu tava olhando, mas não se importava.

- Era tão gostosa assim era?

- Do jeito que tu gosta Jean, Morena do bundão e com cabelo preto.

- Sim, mas continua.

- Pois bem, eu já tava completamente sem dinheiro, mas bebidas de graça estavam vindo, mas no bar só tava eu, a gostosona, e dois gays que puta que pariu, estavam no maior amasso. E dois idosos discutindo provavelmente algum jogo.

- Então as bebidas estavam vindo dela, continua.

- Calma, deixa eu contar direito, ela veio até mim, e disse que seu nome era Verdade. E eu pra não ser rude falei o meu nome, eu fiquei meio assim, porque achei o nome um pouco estranho, mas no mundo atualmente o que não é certo? Mas o nome Verdade era até legal, tinha um tom meio que... não sei explicar... legal sabe?

- Soava sincero...

- Isso mesmo, acertasse na mosca, soava extremamente sincero.

- Ei, aguarda só um pouquinho ai.

Joguei o telefone em cima da cama, fui no barzinho e peguei uma dose de Uísque. Me sentei, procurei uma posição boa, e relaxei. Tomei meu primeiro gole e voltei pro telefone.

- pronto, prossegue ai.

- Sim, vê. Ai eu e ela começamos a conversas, já muito bêbados já eu a convenci de irmos para o apartamento dela. Fomos cambaleando de um lado para o outro e se segurando em nós mesmos. E depois de um tempo, chegamos no lugar... Ela me serviu uma bebida, bebemos, tiramos todas as nossas roupas, e fizemos sexo.

- Foi legal?

- Foi estranho Jean, não sei te dizer direito, foi bonzinho.

- Foi sincero?

- Algo desse tipo.

- Sim, continua.

- A gente pegou no sono, acordamos de madrugada e fizemos a mesma coisa. Bebíamos, fazíamos sexo e dormíamos. Sai da cama e fui no banheiro, assim que voltei, ela tava sentada na ponta da cama, completamente nua, como o chão melado de álcool, com um olhar perdido e com a boca meio aberta, falando bem baixinho.

- Doida? Sonâmbula?

- Rapaz nem sei, só sei que ela tava falando altas coisas de mim, como se realmente soubesse quem eu sou.

- Mas que porra é essa? Não entendi foi nada.

- Jean, ela tava dizendo o meu nome, a minha idade, no que eu trabalhava, que eu poderia ter tudo, todas as coisas de uma vez, todas as coisas que vi, e tudo que eu preciso. Disse os meus defeitos e porque eu deveria arrumar outro emprego e largar o que eu já tenho. Disse que eu tinha que voltar a fazer faculdade. Disse que eu só fazia ficar bêbado e ficar maluco e tratava as pessoas com indiferença e que vivia como pouco dinheiro e vivia pedindo emprestado.

- De novo: Mas que porra é essa?

- Calma Jean, agora é que fica mais estranho. Ela começou  dizer que tem muita gente pelo mundo sofrendo, gente que vive comendo os ossos de outras pessoas e até os seus próprios. Das hipocrisias que existem pelo mundo. De como tudo é pequeno, e por ser pequeno é superestimado, ou como quando as pessoas esquecem ou não acham o caminho para acreditar nas suas próprias mentiras e até verdades. Começou a falar bem mais veloz, como se tivesse possuída, feito aqueles filmes, suava pra cacete, e ficava me olhando nos olhos como se esperasse alguma coisa de mim. Depois começou a falar de consumismo e abstenção e do quanto eu era sozinho.

- E ai?

- Ela me puxou, me apertou muito forte, que eu fiquei com marcas no meu braço, arranhões que não saíram até agora. E que tá doendo pra cacete. A louca ainda me empurrou contra a parede e me sacudiu, e eu sem saber o que tinha feito.

- E que danado tu fez?

Nessa hora eu ouvi que a respiração dele tava intensa e pesada, um choro discreto no telefone e um começo de um leve surto. Eu disse que ele tivesse calma, e respirasse bem fundo, pra que terminasse de contar o resto.

- Jean, acho que eu matei ela. Dei uma garrafada nela com muita força, acho que nunca tinha botado tanta força na vida. Eu avisei varias vezes pra ela ficar calada, e ela não calou, eu afundei os cacos na cabeça dela e ela caiu. Fez aquele barulho pesado, e o sangue saiu escorrendo pelo chão.

- O que tu tinhas na cabeça pra ter feito isso?

- Não sei Jean, me desesperei.

- Relaxa, pega no braço dela e ver o pulso ai.

- Tá quase normal, só que fraquíssimo.

- Então ela não morreu

- Serio Jean, ainda bem. Nem deu pra pensar em fazer isso.

- Pronto, agora tira os cacos que tá na cabeça dela, deixa dinheiro ai e vai embora. E não se esquece de sair como se nada tivesse acontecido pra não levantar suspeitas.

Ele me pediu obrigado e desligou.

Eu já tinha acabado a minha dose, então voltei lá no barzinho, peguei o resto da garrafa, me sentei na cama, dei uns bons goles no meu Uísque, e apaguei abraçado com a garrafa de Johnnie Walker, enquanto a Verdade e a Loucura agonizavam em um apartamento imundo qualquer.





"A psicologia nunca poderá dizer a verdade sobre a loucura, pois é a loucura que detém a verdade da psicologia."
Michel Foucault




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